O dia escolhido para homenagear o Zumbi dos Palmares, líder quilombola que lutou pela libertação dos negros, traz a necessidade de não esquecermos o passado e refletir sobre o racismo estrutural existente até hoje. Neste 20 de novembro, quando é celebrado o Dia da Consciência Negra, o Grupo Editorial Record indica algumas obras de autores negros que fizeram – e ainda fazem – história, expondo suas vivências, homenageando seus antepassados e apresentando reflexões contra o sistema de opressão racial. Tudo isso através da arte que é escrever.
Como toda mudança só é possível através de ações, o primeiro livro da lista apresenta, através da perspectiva de uma mulher negra, uma série de medidas que nós – inclusive e, principalmente, pessoas brancas – podemos tomar visando uma sociedade antirracista. Mergulhe nessas obras para além deste dia.
Então você quer conversar sobre raça, de Ijeoma Oluo
Diante dos últimos acontecimentos mundiais relacionados à supremacia branca — da violência policial ao encarceramento em massa da população negra —, os holofotes da mídia parecem se voltar para a questão do racismo em nossa sociedade. Para além das grandes questões de segurança e saúde públicas, este é um tema que permeia o nosso dia a dia. Por que em sala de aula lemos, basicamente, autores homens e brancos (e, muitas vezes, homens brancos europeus)? Como dizer a um amigo que ele fez uma piada racista? Por que sua amiga se sentiu ofendida quando você pediu para tocar no cabelo dela — e como é possível passar a agir corretamente? Como explicar o privilégio branco para seu amigo branco privilegiado? E como ajudar na luta antirracista sendo uma pessoa branca privilegiada? Em Então você quer conversar sobre raça (Ed. BestSeller, R$ 49,90, 312 págs), Ijeoma Oluo orienta leitores de todas as raças sobre assuntos que vão desde interseccionalidade e ações afirmativas a questões que envolvem as “minorias modelo” e o lugar de fala. Mas tendo sempre em vista tornar possível o aparentemente impossível: criar um espaço para conversas honestas sobre raça e racismo e também sobre sua presença em vários setores da sociedade e aspectos de nossa vida.
Um defeito de cor, de Ana Maria Gonçalves
Em Um defeito de cor (Ed. Record, R$ 64,90, 952 págs), Ana Maria Gonçalves conta a história de Kehinde que, após ser capturada na África, embarca em um navio negreiro com destino ao Brasil. Ao longo da travessia, ela vai contando sua vida, marcada por mortes, estupros, violência e escravidão. Quando consegue comprar sua liberdade, a protagonista se casa com um comerciante português, com quem tem um filho que mais tarde é vendido como escravo pelo próprio pai. Quando descobre, Kehinde percorre diversos lugares do Brasil até voltar para a África, na expectativa de encontrá-lo. Lá, ela se casa, tem outros filhos, e se transforma em uma grande empresária, mas não abandona a dor – e não perde as esperanças – em rever seu filho. Com mais de oitenta anos, ela retorna para ao Brasil e transforma seu sofrimento em escritos esperando que ele a encontre. Inserido em um contexto histórico importante na formação do povo brasileiro e narrado de uma maneira original e pungente, na qual os fatos históricos estão imersos no cotidiano e na vida dos personagens, Um defeito de cor é um belo romance histórico, de leitura voraz, que prende a atenção do leitor da primeira à última página.
Nascido do crime, de Trevor Noah
Nascido do crime (Ed. Verus, R$ 54,90, 320 págs) apresenta a história impressionante, inspiradora e divertida da infância e juventude de Trevor Noah, um dos maiores comediantes da atualidade, ambientada durante os anos finais do apartheid e os dias tumultuosos de liberdade que se seguiram. A jornada extraordinária de Trevor Noah — da infância sob o apartheid, na África do Sul, à bancada de um dos mais importantes talk shows dos Estados Unidos — começou com um ato criminoso: seu nascimento. Trevor nasceu de pai branco e mãe negra, numa época em que essa união era punível com cinco anos de prisão. Prova viva de um crime, ele era mantido em segredo, uma das medidas extremas que sua mãe era obrigada a tomar para escondê-lo do governo, que a qualquer momento poderia levá-lo. Finalmente livres com o fim do apartheid, Trevor e a mãe embarcam numa grande aventura, abraçando as oportunidades conquistadas após séculos de lutas. Seus textos se entrelaçam para formar um retrato emocionante e divertido de um garoto tentando avançar na vida em uma época turbulenta, armado apenas com senso de humor agudo e o amor incondicional de sua mãe nada comum.
Querido ex, de Juan Jullian
Querido ex conta em primeira mão os relatos de um jovem cuja vida está sendo definida por um catastrófico acontecimento: seu ex-namorado virou, da noite para o dia, a maior celebridade do país. A única coisa pior e mais desastrosa do que levar um pé na bunda, é levar um pé na bunda e ver seu ex se tornar a maior subcelebridade do Brasil. Mas é justamente a tentativa de colocar a dor em palavras, reunidas em cartas para o maldito ex, que faz com que nosso protagonista repense algumas coisas. Entre crises de luto e saudades, existem festas anuais do dia dos ex-namorados com todas as suas amigas que o seu ex detestava. Existe a vida que você deixou para trás enquanto amava alguém que agora é somente um estranho com milhões de seguidores. E talvez por trás daquele amor existisse também um tanto de controle, de gaslighting, de codependência. Além de abordar de forma sensível, irônica e crua as diferentes nuances de um relacionamento abusivo, Querido ex (Ed. Galera, R$ 34,90, 176 págs) também traz questionamentos sobre os preconceitos sociais que jovens negros e gays estão sujeitos em nossa sociedade.
A cor púrpura, de Alice Walker
Um dos mais importantes títulos de toda a história da literatura, inspiração para a aclamada obra cinematográfica homônima dirigida por Steven Spielberg, o romance A cor púrpura (Ed. José Olympio, R$ 59,90, 336 págs) retrata a dura vida de Celie, uma mulher negra no sul dos Estados Unidos da primeira metade do século XX. Pobre e praticamente analfabeta, Celie foi abusada, física e psicologicamente, desde a infância pelo padrasto e depois pelo marido. Um universo delicado, no entanto, é construído a partir das cartas que Celie escreve e das experiências de amizade e amor, sobretudo com a inesquecível Shug Avery. Apesar da dramaticidade de seu enredo, o livro de Alice Walker se mostra extremamente atual e nos faz refletir sobre as relações de amor, ódio e poder, em uma sociedade ainda marcada pelas desigualdades de gêneros, etnias e classes sociais. A Editora José Olympio também publicou recentemente seu primeiro livro, chamado A terceira vida de Grange Copeland (R$ 59,90, 336 págs) que, com a mesma potência, trata de violência – racial, social, familiar, contra a mulher -, mas também da força humana, capaz de mudar uma realidade inóspita por meio do amor e da ação no mundo.
E eu não sou uma mulher?, de bell hooks
Clássico da teoria feminista, E eu não sou uma mulher? (Ed. Rosa dos Tempos, R$ 29,10, 320 págs) tornou-se leitura obrigatória para as pessoas interessadas nas questões relacionadas à mulher negra e na construção de um mundo sem opressão sexista e racial. Além de examinar o impacto do sexismo nas mulheres negras durante a escravidão, a desvalorização da mulher negra, o sexismo dos homens brancos e negros, o racismo entre as feministas, os estereótipos atribuídos a mulheres negras, o imperialismo do patriarcado e o envolvimento da mulher negra com o feminismo, Hooks pretende levar nosso pensamento além das suposições racistas e sexistas. O resultado é um trabalho revolucionário, um livro imprescindível, a ser lido por todas as pessoas que lutam para tornar o mundo um lugar livre de opressões de raça, cor, classe e gênero.